ESG põe dinheiro no bolso do varejista

Sheila Hissa -

Sandro Benelli, doutorando da FGV em ESG para pequenas e médias empresas e presidente da rede paulista Veran, explica o sistema e avisa: não existe conflito entre ganhar dinheiro e fazer o bem


Foto: Divulgação


ESG, sigla em inglês que trata de práticas ambientais, sociais e de governança, não é modismo, não envolve necessariamente custos e pode, sim, resultar em benefícios para as empresas. Importante: não é ferramenta apenas para grandes companhias e seu uso honesto em marketing é legítimo.

Sandro Benelli, doutorando nessas práticas para empresas médias e pequenas na Fundação Getúlio Vargas e presidente da rede paulista Veran , com 13 lojas, explica a importância do sistema e afirma: as empresas devem ser também responsáveis pelo que vive fora do seu quadrado. Isso pelo bem delas próprias, da sociedade e da economia.

Há 30 anos no varejo alimentar, com carreira no Carrefour , GPA , Casino na França, entre outras, Benelli lidera o Veran há 2 anos, onde já encontrou terreno adubado para o ESG pelos proprietários e conselheiros. Entenda nessa entrevista exclusiva para SA Varejo o que é, como funciona e as vantagens do ESG.

Como empresas de médio e pequeno porte podem se envolver como ESG?
Com ações simples de baixo e até nenhum custo. Cada empresa investe de acordo com o seu tamanho e os recursos financeiros e humanos disponíveis. O importante é definir meios para aferir essas ações, ter uma régua para medir cada iniciativa. Entre não fazer nada e fazer tudo, tem coisa no meio.

Quais são os benefícios para as empresas?
Cada aba da sigla ESG revela benefícios que vão da maior confiança do consumidor ao aumento do valor de mercado da empresa.

O que a letra E significa e como ela pode ser praticada e gerar vantagens?
A letra E corresponde a environmental que traduzido para o português significa defender o meio ambiente. No Veran temos pontos de coleta seletiva em todas as lojas, coisa que a comunidade valoriza muito.  E operamos, por exemplo, com o controle da cadeia fria para evitar desperdícios.

Mas essas práticas são boas para reduzir gastos?
Sim. São boas para o bolso do empresário e para o bem da humanidade. E podem ser bem básicas: desligar o ar condicionado quando o uso for desnecessário, deixar balcões refrigerados regulados, ter redutor de fluxo na torneira nos banheiros, colocar válvulas de descarga de dois estágios, fazer a limpeza com máquinas e produtos químicos e não com mangueira. 

Qual o significado do S no ESG?
O S corresponde ao social, respeito às diferenças e preocupação com o bem-estar da comunidade interna e do entorno. O discurso pode até soar vazio, de tão repetido e explorado, mas continua fundamental, inclusive para os negócios. A alta direção tem de acreditar, dar exemplo, estabelecer metas. Campanhas internas sobre inclusão precisam ser frequentes. Não podemos tratar certos temas como tabu. Eles precisam ser discutidos e condutas de respeito humano devem ser incentivadas.

O que o Veran faz nesse sentido?
A rede tem várias iniciativas. Uma das mais importantes é selecionar e contratar pessoas com talento e conhecimento, independente de cor, religião, gênero. 

O Veran tem negros na equipe?
Mais da metade dos gerentes de lojas são negros, nosso advogado é negro e também o diretor de operações e o gerente de compras da mercearia. Eles não foram contratados ou promovidos por serem negros, mas porque se mostraram os melhores candidatos. O que eu quero dizer é que acreditamos em oportunidade para todos, mas contratamos profissionais, não minorias.

Existe risco de desrespeito às políticas internas de inclusão?
Como presidente da organização, sou responsável por fazer acontecer. O propósito é do Veran, mas o dever de zelar pelas políticas é meu. Felizmente, não enfrentamos problemas aqui.

Esse é um exemplo de iniciativa com custo zero?
Custo zero porque você contrataria de qualquer forma. E tem um efeito positivo enorme. Toda equipe entende que essa inclusão é para valer, não é da boca pra fora. E o consumidor e a comunidade do entorno sentem que a rede está num lugar de respeito e de oportunidades.

Vocês têm um site gratuito para empreendedores dos municípios onde atuam. Como funciona?
É uma iniciativa barata para uma rede média e socialmente responsável. Pagamos para hospedar e fazemos a manutenção da plataforma e as pessoas se cadastram como fornecedores de serviços: encanadores, manicures, eletricistas, empregadas domésticas. Implantamos durante a pandemia, mas agora com os lockdown deu uma esfriada. De qualquer jeito, o espaço continua. Não temos expectativa nenhuma de gerar qualquer resultado financeiro.

O Veran também distribui marmitas para moradores de rua.
Sim, compramos as marmitas de restaurantes locais e entregamos para instituições de caridade que fazem a entrega todas as noites. De um lado é uma questão humanitária, de outro é uma forma de ajudar os restaurantes que têm sofrido bastante na pandemia. Infelizmente com os lockdowns e toque de recolher tivemos de suspender as entregas por hora. Atuamos nos cinco municípios onde temos lojas.

Você recomenda que as empresas tomem várias pequenas iniciativas?
No social, recomendo a escolha de um só caminho: moradores de rua, educação, crianças ou esportes. Funciona melhor porque canaliza os investimentos e consegue fazer algo realmente relevante. 

É um bom marketing, não é?
O marketing não é problema, é legítimo, desde que efetivamente corresponda ao que é feito. Mas, no nosso caso, não estamos muito preocupados com isso. Em dois anos, é a primeira entrevista que dou sobre o assunto.

O G de governança, a última letra do ESG, é apenas benefício para empresa?
Não. Governança diz respeito a iniciativas que ajudam a economia, a geração de empregos e de renda, o desenvolvimento do País. E, claro, beneficia a empresa. O bom empresário é o que ganha dinheiro, é o que lucra para seu benefício e dos acionistas, mas também para pagar impostos, empregar, contratar com carteira assinada, manter fornecedores, prestadores de serviços, etc. Não existe conflito entre ganhar dinheiro e fazer o bem.